- A Cabala é a ciência dos sábios, para uns, a ciência do Bem e do Mal, a ciência da Verdade Absoluta. Diversos estudiosos a têm enaltecido, esmaecido, idolatrado, desprezado e excomungado. Traz em seu bojo o fascínio do inconuto, como sói acontecer com as místicas coisas. O misticismo possui em si essa auréola do divino desconhecido que o homem desde os primórdios aprende a temer. As coisas místicas não são facilmente explicáveis, por incoerentes parecerem muitas vezes com os princípios tradicionais. Os nossos sentidos só reconhecem como verdadeiros aqueles princípios e fatos palpáveis pelos sentidos materiais. Escapa-nos o divino, a origem, o fim, o tudo, algumas vezes por imposição hierática, por tradição, por quaisquer desses véus jogados à mente superior.
- Reportemos à remota era em que o homem começava sua vida social, motivado pela necessidade de sobreviver naquele hostil ambiente recém gelado de 40.000 anos A.C. mais ou menos à época em que a arte lhe assomava o espírito e deixava gravado nas paredes de suas cavernas rupestres cenas que testemunhavam o seu cotidiano ou simplesmente emolduravam poemas e cânticos aos heróis nascentes. Ora, o Sol, ao dia, a Lua, à noite, sempre exerciam grande fascínio sobre a humanidade desde então. Para o leigo observador, maior que o Sol é o Céu, que o abriga em seu seio bem com à Lua e às Estrelas. Quem sabe o Sol seria o Filho do Céu e o irmão da Lua? O Céu se afiguraria assim como o Pai maior daqueles fenômenos desconhecidos sabidamente poderosos.
Mas existem as coisas da Terra e as coisas do Mar, igualmente misteriosas, porém algumas atingíveis. Seria então o mundo fenomenal composto dos três elementos básicos Terra, Mar (Água) e Céu (Ar)? Sabidamente, alguma relação misteriosa existe entre ambos. Não sobrevivem por si só. Alguma indelével argamassa os une e promove um profundo intercâmbio. A Ignorância, o Medo, o Fanatismo, eternos “companheiros” do Homem se encarregam de criar um Panteão de Deuses menores intermediários do Bem e do Mal, entre o Criador e a Criatura. Por alguns históricos instantes sumerianos ou babilônios suprimiu-se o Criador pelos intermediários. O trovão, o vento, a tempestade, a seca, o dilúvio, o terremoto, o vulcão, a fortuna, a fome, toda manifestação da natureza, desconhecida para os homens de então era associada à ação de um deus particular antropomórfico. Mas o Sol sempre exerceu grande fascínio, eclipsando o Pai Maior, o Céu. O Filho é maior do que o Pai porque dispensa energia de vida às suas criaturas. Apolo sobrepujando Júpiter. É o Fogo da Criação, o Criador das coisas da Terra e do Mar; senão criador pelo menos mantenedor das coisas criadas. Um misto de Filho-Pai-Herói. A tríade da criação parece tornar-se Ar-Fogo-Água. Não matéria mas princípios primordiais. Toda criação pode resumir-se na ação conjunta dessa tríade que se tornou a síntese de todas as religiões sob qual nome adotarem ou quiserem os homens.
“No princípio era o Ar... Mas o Ar num esforço de suprema existência exalou de si o Fogo criador e se diferenciou na matéria primordial (água)...” – dando consistência a tudo que existe. Panteismo, dirão alguns, e através de uma bula (1919) ou decreto podem declarar blasfêmias quaisquer declarações que venham contestar os “princípios” ou dogmas existentes. “As coisas de Deus são imutáveis...” – dirão, tornando insolentemente divinas as suas (do homem) coisas criadas e cultivadas com o fim precípuo de subjugar e dominar os homens, na busca não da perfeição, mas do poder temporal. Porém não se mascara a Verdade. O principio trino da criação permanece inalterado na base de todo sistema religioso, ainda que esotericamente o mais das vezes, e este é o eterno principio cabalístico da Criação segundo organizado e desenvolvido nos mistérios judaicos antes mesmo dos egípcios, dos gregos, dos cretenses (ou atlantes, se preferirem). “Então são três princípios?” – Não. São três aspectos de um mesmo princípio universal: é Brahma, Vishnu e Shiva – é Ra, Osairis e Isis – é a Luz, o Bem e o Mal – é o Pai, o Filho e o Espírito Santo – é o Supremo Arquiteto do Universo, enfim, na sua forma mais simples, pura e total. Não é Hiram, o Sol, que como Osíris, é morto para que possa renascer com todo esplendor. Não é Krishna, herói, filho de Brahma, nascido de virgem. É o Supremo Arquiteto do Universo, o Tetragramaton impronunciável dos iniciados. Não é um nem três, é o único em sua multiplicidade, por isso onipresente, onisciente, onipotente. Não é panteísmo. É o mais puro hálito da Verdade em sua face atual.
Diz a Cabala: “O Ar – o primeiro principio – emanou de si o Fogo e a Água – segundo e terceiro princípios”. O Fogo é o principio ativo da Luz. Não é a Luz, mas imanente e sempiterno. A Água é o principio passivo da Luz. É o principio da criação material. É + e – ao mesmo tempo. É Adam-Kadmon. O quaternário está presente no ternário através da duplicidade desse aspecto da Luz. É Sabedoria, Força e Beleza em união na criação do universo. A Sabedoria do Ar; a Fôrça do Fogo; a Beleza da Água na formação e constituição da Luz. A Luz vem do Oriente e se propaga no Ocidente sob a guarda dos pilares da Força estabelecida. O que há de blasfemo nisso? É tão simples a compreensão desse principio! Não há mistérios em tal simplicidade senão a insondabilidade do principio original que ultrapassa o nosso vão conhecimento. Por que transformar verdade tão clara em figuras à nossa imagem e semelhança? Esta concepção antropomórfica sim, estará negada pelos mais tênues princípios cabalísticos.
Passam reis e sábios e opressores, mas permanecem para sempre à disposição do buscador as suas verdades sob o véu de Ísis sob a forma de símbolos. A Ordem é profícua nestes silentes e quão eloqüentes símbolos como se a preservar em seus templos e rituais toda a síntese apoteótica da humanidade pelos seus mistérios cabires, egípcios, caldeus, judeus, gregos, hindus, universais enfim. Cego é o que não quer ver a profusão de cores da Criação nos seus tons primários de Azul, Vermelho e Verde – se eletrônicas ou Azul, Vermelho e Amarelo – se materiais. Surdo aquele que não pode ouvir a silaba universal ecoando pelo universo fenomenal. Não é preciso ser sacerdote ou um iniciado. Consulte simplesmente uma escala de vibrações e sintam os sons que formam o universo, que governam nossas vidas, no bem e no mal, na alegria e na dor. Isto é ciência pura, é Física.
Todos os fenômenos materiais vibram com alguma intensidade na freqüência própria da Palavra Perdida. Não nos cabe procurá-la nesse emaranhado de sons que forma a humanidade. Cabe-nos, isso sim, enunciarmos cada fragmento da palavra no tom e freqüência corretos. É este o trabalho do Aprendiz na Pedra bruta; É este o trabalho do Companheiro na Pedra polida; É este o trabalho do Mestre na Câmara do Meio.. “Viemos aqui para submeter nossos caprichos, cavar masmorras aos déspotas e fazer novos progressos na humanidade” – Que missão mais sublime!
Aí está, meus irmãos, o Principio Cabalístico da Criação, sem mistificações, sem os característicos termos judaicos originais, mas tão somente sua essência. A Cabala original não prescinde o alfabeto judeu. Cada letra está associada a um principio e seria necessário conhecer-se o alfabeto judeu e cada aspecto associado a cada uma das letras para que pudéssemos entender como o “Verbo se fez Deus e o Verbo era Deus”.
IOD, HE e VAV são as três letras associadas aos princípios aqui abordados. IOD é o primeiro principio – o Ar; HE é o segundo principio – o Fogo; mas o terceiro principio é duplo, é HEVAV, Istoé, diferenciado em HE e VAV. Estas três letras diferenciadas em quatro pela repetição do HE formam uma palavra impronunciável, o Tetragramatom, o IODHEVAVHE, o Jeová dos iniciados. O sublime está na percepção de que “IODHEVAVHE” não é a Luz, mas uma manifestação trina da Luz.
Os princípios da Cabala tradicional se completam ainda por mais sete aspectos que concluem a árvore sephirotal , compreendendo-se por sephirot cada um dos dez números cab alisticos fundamentais, os quais juntos às vinte e duas letras do alfabeto hebraico determinam a criação dos elementos conforme o Sepher Yetsira – O Livro da Criação. “As vinte e duas letras hebraicas e os dez sephirot são as trinta e duas sendas místicas com as quais Deus criou o Universo, através da combinação e da permuta”.
Os sete princípios seguintes se distribuem em dois grupos de três e mais um. O primeiro grupo é composto por HESSED, Tiferet e Din, ou seja, Graça, Beleza e Justiça, formam o mundo do sentimento... O outro ternário comporta NETSAH, IESOD e HOD, ou a Vitória, o fundamento e a majestade compondo o mundo da Natureza. O décimo dos sephirot é MALKUT, o mundo material. HESSED e NETSAH formam a coluna do Amor e da Misericórdia de Deus. DIN e HOD formam a coluna da Fôrça e da Justiça devina. TIFERET é o coração e o sentimento. IESOD é a base da vida e da eternidade, é descendência ou força criadora no Homem.
Eis rapidamente o que se pode dizer acerca de alguns aspectos da Cabala. Muito mais está à sombra da árvore do conhecimento. Faltam-nos meios para alcançarmos tão ditosa fruta. Simples são os caminhos da Verdade. Tão simples que muitas vezes enveredamos pelos caminhos da presunção e da empáfia na fanática obsessão do saber sem sequer nos darmos conta daquela humilde e estreita estrada alhures deixada como insignificante e que no entanto nos teria levado diretamente ao objetivo .